sábado, 22 de agosto de 2015

O sonho dos feixes curvados

Em Gênesis 37:5-8 a Bíblia nos conta sobre um sonho que José, filho de Jacó, tivera e que narrara aos seus familiares: “Teve José um sonho, que contou a seus irmãos; por isso o odiaram ainda mais. E disse-lhes: Ouvi, peço-vos, este sonho, que tenho sonhado: Eis que estávamos atando feixes no meio do campo, e eis que o meu molho se levantava, e também ficava em pé, e eis que os vossos feixes o rodeavam, e se inclinavam ao meu molho. Então lhe disseram seus irmãos: Tu, pois, deveras reinarás sobre nós? Tu deveras terás domínio sobre nós? Por isso ainda mais o odiavam por seus sonhos e por suas palavras”.

No domínio da teologia judaica há um aviso importante sobre os fatos narrados na Torá. Dizem os sábios que se a Torá diz, então deve-se prestar muita atenção. Baseados nessa premissa vamos analisar um pouco do sonho acima.

Na verdade, o capítulo 37 de Gênesis fala de dois sonhos; um ligado ao trabalho no campo, ou seja, às coisas deste mundo e outro onde aparecem o Sol a Lua e onze estrelas, nos informando que as coisas terrenas estão ligadas às coisas dos céus. Do mesmo modo, no sonho de Jacó, era vista uma escada que ligava a Terra ao Céu. Estes sonhos parecem informar que os acontecimentos terrenos não estão desligados da percepção celeste.  No entanto, vamos focar no primeiro sonho de José e tentar ver o que podemos aprender ali e trazer para nossos dias.

O sonho começa com a aproximação de hastes que estavam separadas e foram atadas em feixes. O sonho começa com trabalho, e por este motivo, é útil entendermos o que significa trabalho. Avodá é a palavra que aparece, e esta significa o esforço envolvido no serviço a Deus. O serviço a Deus deve envolver ações físicas que levam à santidade. Deve haver diligente trabalho para satisfazer as exigências da Lei.  Veja bem, no domínio profano não há esforço para o serviço a Deus, há esforço para o serviço egoísta, e no caso do sonho de José todos trabalhavam para juntar feixes.

O Rabi Jonathan Sacks, em sua obra Lições da Torá, narra um episódio sobre o Rebe Maharash, que discutia com os seus dois filhos pequenos sobre as virtudes do judeu, e para demonstrar o seu argumento, ele perguntou ao seu criado: “Bentsion (filho de Sião) – você comeu? Sim, respondeu o servo. Você comeu bem? Estou satisfeito, graças a Deus. Por que você comeu? Para viver. Por que você vive? Para ser um judeu e para fazer aquilo que Deus deseja. Ao dizer isto, o servo suspirou”. Mais tarde o Rebe Maharash disse aos seus filhos: “Vejam, um judeu tem uma intenção espiritual em toda ação física, os próprios atos são espiritualizados.

A história acima traz luz à mensagem contida no sonho de José. O fato de estarem trabalhando e atando feixes significa que num mundo separado de Deus, num mundo de ocultação que é como um campo, as coisas e as pessoas crescem separadas. Esta é a orientação do inimigo, a orientação do ego, que cria a dessemelhança e a separação. No entanto, o cristão deve ir além disso, atando feixes, ou seja, atando como feixes as muitas facetas do próprio ser unificando-as num serviço transcendente ao ego e a separação, num serviço a Deus. Esta é uma tarefa pessoal e intransferível, a qual deve ser auxiliada pela educação, pelo estudo, pela dedicação no aprimoramento moral. A semelhança do servo do Rebe Maharash, que comia para ter saúde e assim servir a Deus, temos obrigação de prover nosso desenvolvimento num mundo físico para poder atuar no serviço a Deus, atando os feixes.

Há ainda uma perspectiva coletiva. O realizar feixes significa que ao cristão foi destinada a tarefa de juntar os dispersos, os homens a serviço do mundo, a serviço do ego, e junta-los em feixes tornando-os unidos para que ao invés de membros individuais atuem em harmonia na direção a um objetivo adequado. Chamamos a atenção para o propósito da Igreja de Deus. Em Romanos 12:3-11 lemos: ”Porque pela graça que me é dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, conforme a medida da fé que Deus repartiu a cada um. Porque assim como em um corpo temos muitos membros, e nem todos os membros têm a mesma operação, assim nós, que somos muitos, somos um só corpo em Cristo, mas individualmente somos membros uns dos outros. De modo que, tendo diferentes dons, segundo a graça que nos é dada, se é profecia, seja ela segundo a medida da fé; se é ministério, seja em ministrar; se é ensinar, haja dedicação ao ensino; ou o que exorta, use esse dom em exortar; o que reparte, faça-o com liberalidade; o que preside, com cuidado; o que exercita misericórdia, com alegria. O amor seja não fingido. Aborrecei o mal e apegai-vos ao bem. Amai-vos cordialmente uns aos outros com amor fraternal, preferindo-vos em honra uns aos outros. Não sejais vagarosos no cuidado; sede fervorosos no espírito, servindo ao Senhor”.

Cabe aos líderes religiosos trabalhar para que os feixes sejam atados. O pastor de uma comunidade, o pai de uma família, todos devem trabalhar para que os feixes estejam construídos. No entanto, a segunda parte do sonho é ainda mais importante. Os feixes depois de atados e adicionados curvaram-se diante do molho de José. Estamos falando do aprimoramento no serviço; o ato de curvar-se ou submeter-se àquilo que é ainda mais elevado do que nós. Os cristãos formam uma unidade como se fossem membros de um mesmo corpo. Assim como um corpo é coordenado somente quando seus músculos obedecem ou respondem às ordens do sistema nervoso central, também a saúde espiritual dos cristãos depende de sua submissão à cabeça que é Cristo. É Ele quem instrui aos cristãos para atuarem em harmonia, em direção ao serviço adequado. De fato, sem a unificação e a submissão jamais poderão os cristãos realizarem o serviço a Deus.


A lição importante extraída desse primeiro sonho de José é que primeiro se deverá atar feixes e depois a submissão.

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