terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Deus revela a si próprio

Uma leitura obrigatória para os cristãos é o livro de Jó. De acordo com informações históricas, é de autoria de Moisés. Foi o primeiro livro escrito de todos os que compõem a Bíblia. Considerando que Moisés é reputado como o profeta mais eminente, pois Deuteronômio 34:10-12 refere-se a ele da seguinte forma: “E nunca mais se levantou em Israel profeta algum como Moisés, a quem o SENHOR conhecera face a face; nem semelhante em todos os sinais e maravilhas, que o SENHOR o enviou para fazer na terra do Egito, a Faraó, e a todos os seus servos, e a toda a sua terra. E em toda a mão forte, e em todo o grande espanto, que praticou Moisés aos olhos de todo o Israel”, melhor será considerar o que ele escreveu como importante leitura.

Há na compreensão dos teólogos duas maneiras pelas quais Deus revelou a si mesmo: 1) através da criação, onde pode-se verificar em atuação os princípios que embasam Seu governo, ou seja, pode-se ver a lei de Deus em funcionamento. A revelação através da natureza é chamada de natural. No Salmo 19 está descrito como o salmista percebia a revelação de Deus através da criação. 2) a chamada Sagrada Escritura, a Bíblia, onde Deus revela a si próprio falando diretamente ao homem. Esta revelação é chama de especial.

Assim, o primeiro livro escrito por Moisés tem como finalidade introduzir toda a Bíblia, mostrando do ponto de vista do próprio Deus a grande controvérsia iniciado por Satanás, quando ainda se encontrava no céu, mas que tem seu prosseguimento na Terra, como consequência da adesão de adão à proposta de Satanás. Moisés mostra como é a atuação dos protagonistas desse embate cósmico, qual o papel das criaturas especificando a postura humana e sua compreensão desse conflito. Por tais razões, não se pode menosprezar as informações contidas no livro de Jó.

Os diálogos do livro são colocados propositalmente para que sejam esclarecidos ensinamentos capitais e plantadas as ideias que poderão ser úteis para as escolhas humanas.

O primeiro diálogo se dá entre Deus e Satanás. Nele estão as posições de ambos. O assunto introduzido por Deus é a Sua justiça e abnegação. O assunto introduzido por Satanás é a impossibilidade de justiça e abnegação por parte de Deus. Este não pode ser abnegado porque possui poder absoluto. Assim, a solicitação de abnegação às criaturas é um ato de injustiça, e neste ambiente, Jó não suportaria nenhuma prova.

Também não há, segundo Satanás, nenhuma integridade em Jó. Não há nenhum justo. Uma vez que a Terra está submetida ao sistema não abnegado de Satanás, nenhum homem será abnegado e, por conseguinte, Jó serve a Deus por puro egoísmo. Satanás contesta toda estrutura religiosa como capaz de melhorar o homem.

Depois, os diálogos que seguem são os humanos. Os amigos de Jó aparecem e Deus não está mais presente ou fica como que oculto. Os argumentos são sempre na direção da defesa de Deus. Os amigos julgam que Jó tenha cometido algum demérito religioso e sofre, naturalmente, as consequências. Suas mazelas são castigos divinos. O conceito evocado pelos amigos necessita ser avaliado. Trata-se da compreensão humana da teologia. Os sistemas religiosos criados pelo homem são de molde a dar condições de aquisições meritocráticas para pleitear a atenção divina. Assim, os amigos de Jó argumentavam que faltava a ele mérito. Esta ideia de que o homem pode produzir boas obras e ser digno é o fundo do sistema religioso judaico, o mesmo que fora combatido por Jesus. O argumento está colocado na dinâmica religiosa cristã onde ritos se tornam moedas de troca.

É importante que se analise o fundamento colocado pela Bíblia sobre o que deve ser buscado por um religioso. A palavra cristão significa seguidor de Cristo. Assim, os cristãos seguirão seu mestre, farão as mesmas obras e abraçarão a formação de um caráter semelhante ao de Jesus. Paulo adverte que devem os cristãos imitar a Cristo; João diz que aquele que segue a Cristo o demonstrará realizando as mesmas obras que Ele executou. Assim, as boas obras são de fundamental importância para definir de que lado estão os seguidores de Cristo. “A vida daquele em cujo coração Cristo habita, revelará a piedade prática. O caráter será purificado, elevado, enobrecido e glorificado. A doutrina pura estará entretecida com as obras de justiça; os preceitos celestiais misturar-se-ão com as práticas santas” (Ellen White, Refletindo a Cristo, p.73).

Por outro lado, o sistema sacrifical ensinava que apesar do perdão e das boas obras, era necessário um substituto para que o pecador não viesse a sofrer a penalidade da lei. Assim, era necessária a figura de um salvador que tivesse meios para pagar a dívida em relação à lei. Nesse caso, a Bíblia nos informa que o nosso substituto ou salvador é Cristo. No livro de Isaías no capítulo 53 temos a explicação de como Jesus nos substituiu. Mas o verso 4 do referido capítulo traz o sistema teológico humano onde encontramos que “nós o reputávamos por aflito”, o mesmo argumento usado pelos amigos de Jó para explicar a razão do sofrimento dele. Podemos ver que o sistema religioso humano prevê que se houver boas obras haverá também o mérito. Mas definitivamente é necessário um salvador, porque estamos submetidos às correntes de Satanás e estas somente serão quebradas com a morte, e neste caso, necessitamos da ação de um salvador que possa nos livrar da pena. Essa condição está explícita em Hebreus 2:14-15: “E, visto como os filhos participam da carne e do sangue, também ele participou das mesmas coisas, para que pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabo; E livrasse todos os que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à servidão.

A necessidade de um salvador está negada no sistema cristão de méritos. A igreja romana substituiu Cristo pelo sacerdócio romano; os fiéis vão até um sacerdote e buscam nele a intermediação e o perdão. O sistema romano vai muito além, propõe a salvação através da missa e a canonização se o fiel tiver méritos. O santuário celeste onde Deus está e onde se processa o juízo foi transferido para Roma. Os homens são deuses conforme prometera a serpente para Adão e Eva. Esse é o grande engano; um sistema religioso no qual o mérito é suficiente. Tal entendimento perpassa também a maioria das teologias protestantes.

Agora voltando ao livro de Jó, encontramos o principal diálogo. De repente, Deus reaparece a partir do capítulo 38 e começa a revelar-se de uma forma didática e absoluta.

Antes Jó advogava que se lhe fosse dada a oportunidade de dialogar com Deus, explicaria sua situação e demonstraria a Deus aspectos da realidade humana que, segundo sua compreensão religiosa, por Deus não ser homem, escaparia à percepção dEle. Assim Jó montou uma lista de perguntas que seriam a sua defesa. Porém, quando Deus passa a revelar-se demonstrou Sua onipotência e onisciência de uma forma que Jó percebeu-se indigno. Deus não entregou nenhuma explicação sobre o sofrimento de Jó, mas discorreu sobre a abnegação divina, mostrando que a encarnação de Jesus e todo o Seu sofrimento e morte são a antítese que nega as afirmações de Satanás. Após isso, Jó compreende que o sofrimento humano não tem nenhuma importância, pois é a cortina de fumaça usada para impedir a visualização do caráter de Deus; que o grande conflito é muito maior que o egoísmo humano; passa a compreender o papel do homem diante do universo e exclama “Então respondeu Jó ao SENHOR, dizendo: Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido. Quem é este, que sem conhecimento encobre o conselho? Por isso relatei o que não entendia; coisas que para mim eram inescrutáveis, e que eu não entendia. Escuta-me, pois, e eu falarei; eu te perguntarei, e tu me ensinarás. Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te veem os meus olhos. (Jó 42:1-5).


Podemos perceber, pelo exposto acima, que o sofrimento no contexto deste mundo é provocado pelo inimigo. O propósito dele é formar um ambiente no qual surja o raciocínio da não abnegação de Deus. Trazendo sofrimento Satanás julga que nenhum homem poderá querer abnegação; olhará para si mesmo com autocomiseração e inquirirá onde está a justiça. Neste contexto, um sistema religioso que oferece o mérito como barganha para bênçãos é uma inteligente maneira de reforçar a tese de que Deus não é justo nem abnegado. Não estamos lidando com um inimigo ingênuo, mas sim com uma mente muito altamente capaz e que não deve ser subestimada. Assim, a tarefa de conhecer Deus é o caminho seguro conforme demonstrado no livro de Jó. A cruz é a demonstração da obra de redenção humana, além de manifestar o amor de Deus ao universo; a cruz refuta as acusações de Satanás da impossibilidade de um Deus abnegado.

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Confiando em coisas não confiáveis


No próximo ano (2017) dar-se-á a comemoração conjunta católico-luterana dos 500 anos da Reforma protestante que iniciou em 31 de outubro de 1517, quando Lutero afixou as 95 teses na porta da igreja católica de Wittenberg, Alemanha. Esse momento de comemoração se tornará um marco importante no aperfeiçoamento do poder papal, promovendo a aproximação fundamental com a principal liderança protestante, que poderá resultar no anunciado ecumenismo que antecederá os últimos episódios antes do final da história do pecado. Um dos pontos divergentes entre católicos e luteranos está na justificação pela fé. A controvérsia ocorre no aspecto da obra humana que, segundo Lutero, não pode ser apresentada a Deus como garantidora de méritos à salvação. Assim, o conceito de pessoa justa é o foco da controvérsia. 

Essa questão é muito remota. Aparece no mais antigo livro da bíblia, o de Jó, onde logo no primeiro verso do capítulo inicial Deus o define como íntegro. Tal adjetivo é definido no dicionário como inteiro ou completo, significando ser honrado ou imparcial. O referido conceito não propõe a ideia de impecabilidade, mas, na tradição judaica associou-se a palavra Tzedek = justiça com a palavra Tzedaká = justiça social. Erroneamente traduziu-se esta palavra como sendo caridade. Tzedaká não é caridade. A Tzedaká, seria não só “dar o peixe, mas ensinar a pescar”. Não só dar o pão, mas oferecer um emprego ou uma bolsa de estudos.  Assim, Jó era íntegro e não santo como quer o conceito cristão. É importante notar que Jó fazia sacrifícios por ele e por seus filhos e, por esse motivo, Deus o considerava íntegro. Integridade somente é comunicada através de atos de fé nas promessas de salvação, ou seja, tomando a justiça de Jesus como produtora de perdão.

O diálogo entre Deus e Satanás no primeiro capítulo do livro de Jó é revelador do estado desse homem considerado um servo de Deus. Assim, nos versos 6 a 12 vemos o que segue: “E num dia em que os filhos de Deus vieram apresentar-se perante o SENHOR, veio também Satanás entre eles. Então o SENHOR disse a Satanás: Donde vens? E Satanás respondeu ao SENHOR, e disse: De rodear a terra, e passear por ela.  E disse o SENHOR a Satanás: Observaste tu a meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele, homem íntegro e reto, temente a Deus, e que se desvia do mal. Então respondeu Satanás ao SENHOR, e disse: Porventura teme Jó a Deus debalde? Porventura tu não cercaste de sebe, a ele, e a sua casa, e a tudo quanto tem? A obra de suas mãos abençoaste e o seu gado se tem aumentado na terra. Mas estende a tua mão, e toca-lhe em tudo quanto tem, e verás se não blasfema contra ti na tua face. E disse o SENHOR a Satanás: Eis que tudo quanto ele tem está na tua mão; somente contra ele não estendas a tua mão. E Satanás saiu da presença do SENHOR.

Nos argumentos dialéticos acima vemos que Satanás sabia que nenhum homem possui justiça. Assim, ele afirma que a obediência de Jó não era isenta de interesses. O que está em pauta é nossa essência egoísta que não nos permite guardar a lei sem interesses. Nossos atos são pecaminosamente ofensivos se a justiça de Cristo não nos for por cobertura. Tudo parece mais claro a respeito do comportamento humano quando observamos a ação de Satanás, na vida de Jó, na tentativa de comprovar suas afirmações. Ele tira inicialmente a riqueza, a principal pilastra na qual toda humanidade se apoia. Depois o inimigo subtrai a família, outra importante pilastra e em seguida afeta a saúde. Essas três pilastras são parte do arrimo que ampara todos os homens e nelas estava também a confiança de Jó. Como se não bastasse, os amigos de Jó aparecem construindo diálogos que ratificam a ideia de segurança na religião. Esta constitui parte da estrutura de arrimo humano. Para os amigos, Jó estava devendo maior rigor religioso, razão para o sofrimento. Porém, para Jó não havia nenhum passivo religioso que justificasse o seu estado. Por essa razão, um encontro com Deus poderia dar-lhe a chance de explicar o que, segundo Jó, escapava da percepção divina sobre a condição humana. No entanto, no capítulo 38, quando começa o diálogo de Deus com Jó, a divindade não responde a nenhum dos argumentos de Jó, levando-o a entender que sem conhecer ao próprio Deus ninguém pode entender as dinâmicas envolvidas na estrutura terrestre e que dizem respeito à disputa entre o bem e o mal.

Deus não debateu com Jó nenhuma razão para o seu sofrimento. Apenas revelou-se como o Senhor de todas as coisas e a causa primária de tudo, ou seja, se Ele tem tudo sob Seu controle, o sofrimento de Jó era parte do seu plano para aprimoramento. Ao perceber a onisciência de Deus, Jó não pode perguntar nada, apenas se deu conta da própria indignidade.

O apóstolo Paulo parece ter passado por um momento semelhante quando solicitou que Deus o curasse do “espinho” que feria a sua carne. A resposta de Deus foi “a minha graça te basta”, significando que Paulo deveria prosseguir em conhecer Deus; e ele aquietou-se.  

Conhecer Deus deveria ser a tarefa mais importante para todos os que se aproximam dEle. Em Jeremias 9:24 lemos: “Mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em me entender e me conhecer, que eu sou o SENHOR, que faço beneficência, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o SENHOR”. Há uma razão para tal proceder. O conhecimento sobre Deus trará paz, especialmente nas circunstâncias de uma realidade pecaminosa. Na medida em que Deus se revelar, passaremos a compreender nosso próprio papel na luta entre o bem e o mal, nas várias dimensões nas quais estamos submetidos, ou seja, qual a nossa participação nos plano universal e humano, no sentido de cooperar com nosso Deus na reivindicação da justiça.

Deus revela-se a Jó através de inúmeras perguntas que o levam a perceber que seu sofrimento não era importante em si mesmo, mas uma ferramenta que, no caso de Jó, o levaria a entender melhor o seu próprio comportamento. Assim, pode-se entender algo muito importante: o sofrimento de cada um é pessoal e pode significar que a confiança esteja ainda calcada em pilastras que não podem sustentar. Veja-se o que Jó exclamou “ Então respondeu Jó ao SENHOR, dizendo: Bem sei eu que tudo podes, e que nenhum dos teus propósitos pode ser impedido. Quem é este, que sem conhecimento encobre o conselho? Por isso relatei o que não entendia; coisas que para mim eram inescrutáveis, e que eu não entendia. Escuta-me, pois, e eu falarei; eu te perguntarei, e tu me ensinarás. Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te veem os meus olhos. Agora te conheço, antes apenas tinha ouvido falar”. Essas afirmações significaram a libertação de alguém que estava confiando em coisas não confiáveis. Jó entendeu a onipotência de Deus. A primeira coisa que ele reconhece é o limite de seu conhecimento. Suas conclusões se baseavam na ignorância; portanto, embora ele fosse sincero, estava errado.

Quão inadequado parece ser o conhecimento parcial quando brilha a luz de uma verdade maior! Quando Jó fez suas queixas, seu raciocínio lhe parecia irrefutável. Ele achava que sua atitude era justificada. Mas, quando entendeu a Deus mais claramente, seu raciocínio anterior não mais pareceu convincente. A lógica humana muitas vezes se demonstra falha. Ideias que hoje parecem sábias podem se tornar absurdas amanhã. A disposição de Jó para admitir sua ignorância é elogiável. Ele não tenta se desculpar ou defender sua posição. É tão honesto em sua confissão como foi em sua argumentação. Esta característica é parte da integridade que o relato atribui a Jó desde o princípio (Jó l:l). (SDA Bible Commentary, 690).


quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Viver é uma grande aventura


Hoje escrevo porque Deus me concedeu a subida honra de completar mais um ano. À medida que passa o tempo, espera-se que a vida force aparecer mais tolerância, sensatez e sabedoria. Mas, essas coisas não acontecem naturalmente, tolerância se pratica e se adquire praticando, sensatez vem pela experiência vivida, pelos embates, porém se não houveram embates e a vida foi vivida atoa, é pouco provável a aquisição de sensatez. A sabedoria é ainda mais difícil, considerando que é necessária adição de informação, e esta não é aditada automaticamente. Assim, viver é um a aventura que pode ser calculada e pensada.

Minha vida tem sido uma grande aventura com altos e baixos. Muitos altos e uns poucos baixos. Hoje, vivendo a experiência da década dos sessenta, posso olhar para trás e ver, com muita nitidez, o quanto fui dirigido por um Deus que tem se esforçado em dar-me o que eu não teria pensado por mim mesmo.

Nasci numa família de classe média, meu pai era um excelente Pastor e Professor, um homem muito culto que me ensinou a olhar para o elevado e sofisticado. Em casa ouvíamos música clássica e líamos livros biográficos para termos exemplos edificantes. A mim, especificamente, minha mãe impunha a leitura bíblica onde histórias como a de José e Daniel eram estudadas antes dos folguedos. Como qualquer jovem, às vezes achava um pouco exagerado o jeito de minha mãe educar e, talvez, não tenha aproveitado melhor o ambiente em casa. Minha mãe tinha paixão por música e queria que os filhos fossem grandes músicos. Deu-nos o apoio para estudar música, mas eu mesmo não compreendia totalmente o interesse de minha mãe. Todavia, percebia que eu era dotado de dom musical, pois qualquer instrumento me parecia fácil manusear. Mesmo assim, não dominei completamente nenhum. Frustrei minha mãe.

Presentemente sei que Deus foi muito generoso conosco. A mim deu-me mais que eu podia ter e deu-me estrutura emocional e logística para desenvolver minhas capacidades. Sei que me deu boa dose de aptidão para línguas e sempre soube que sabia lecionar. Deus foi mesmo muito generoso.

Quando cheguei à idade de 17 anos senti vontade de aprender a pilotar aviões. Eu sempre tive muita facilidade para dominar máquinas, andava muitíssimo bem de bicicleta, motoneta e aprendi a dirigir carros sem nenhum professor. Queria aprender a voar e matriculei-me no Aeroclube do Pará, onde comecei as aulas teóricas e práticas e finalmente tornei-me um piloto aviador. No avião nunca senti dificuldades, achava as manobras fáceis de realizar e tinha imensa satisfação em pilotar. Minha coordenação motora sempre foi muito boa e tornei-me um excelente piloto. Parti então para o curso de piloto comercial, o aprendizado que daria possibilidades para assumir o comando de aeronaves comerciais. Viajei a São Paulo para os exames médicos obrigatórios, realizados pelo hospital da aeronáutica. Quando terminei os exames, o médico que nos acompanhou me chamou ao seu gabinete para comentar os resultados dos exames psicológicos e de saúde. O médico começou a entrevista perguntando se eu sabia o que era ser um piloto. Fiquei intrigado com a pergunta, mas não senti maldade na voz do médico, apenas um desejo de orientar. Perguntei-lhe a razão da indagação. Ele respondeu-me afirmando que ser um piloto não era essencialmente diferente de ser um motorista. Então mostrou-me o resultado dos meus testes. Eu havia errado nove vezes. Normalmente, os que saíam da média para cima, naqueles exames, erravam doze vezes; o meu resultado significava que eu estava apto para tarefas mesmo mais complexas. Incentivou-me o doutor a buscar realizar coisas ainda mais altas. Saí daquela entrevista com a sensação única de vitória inesquecível. Minha vida como piloto não foi vivida como planejara, mas sabia que poderia pensar em outras possibilidades. 
Minha família não sonhava que eu ingressasse na aviação, mas meu pai custeou inteiramente o curso de aviação, ou seja, não tolheu meus sonhos dando-me asas para voar o quanto quisesse.

Logo veio a minha entrada na universidade. Acabara de acontecer uma profunda reforma nacional no ensino superior e tudo estava diferente. Fiz opção por medicina e quando cheguei para o curso, logo compreendi que não era vocacionado para ser médico; não me via em hospitais e nem passando a vida inteira com doentes. Desde muito cedo pensava em pesquisa científica e minha entrada no curso de medicina tinha uma razão: buscar o background para entender biologia e encontrar uma carreira de pesquisas em patologia ou parasitologia, ou alguma linha correlata.

Quando alcancei o sexto período, a universidade implantou o curso de Biologia. Então pensei em mudar de curso e realizar meu sonho. Foi muito difícil, pois era senso comum que medicina era uma carreira de elite e, no meu caso, não estar interessado era como se sofresse de desequilíbrio. Assim, depois de uma intensa luta interior decidi cursar Biologia. Nem preciso dizer que no seio da minha família a notícia caiu como um raio. Causei muita tristeza e decepção, mas persisti no meu sonho. Meu pai recomeçou a orgulhar-se quando assistiu minha defesa de tese de mestrado, momento de grande contentamento e realização, quando logrei a nota dez com louvor e distinção. Somente então passei da posição de vergonha para família, para a de vencedor. Minha performance durante o mestrado fora muito boa, tendo sido convidado a permanecer no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA, ocupando uma posição como pesquisador. Meus planos não eram esses, almejava ir para os USA onde pretendia fazer o doutorado. No entanto, aceitei e comecei meu caminho como profissional da ciência.

Imediatamente saí para meu doutoramento na Universidade de São Paulo – USP capital, (como afirmei, não estava nos meus planos, mas nos de Deus) e em quatro anos defendia minha tese doutoral na área de Zoologia, e novamente lograra nota dez com louvor e distinção. Deus havia me abençoado de forma generosa. Neste período tive o privilégio de realizar parte do doutoramento nos USA, na maior e melhor instituição de pesquisas do mundo, o Smithsonian Institution, em Washington D.C.. Ali pude ver que Deus estava no comando de tudo e que me levara para São Paulo com muita razão. Minha formação pode alcançar densidade e ser refinada junto a uma das mais importantes autoridades em Zoologia do mundo, o mesmo que insistiu para que eu fosse para a USP. Percebi ali nos USA que se tivesse ido para lá e não para a USP, não teria tido as mesmas oportunidades de aprender com profundidade.

Não passei por grandes dificuldades em minha vida; sempre consegui ser fiel aos princípios religiosos aprendidos no meu lar paterno e seguindo em frente com segurança, retornei à Manaus, ao INPA, onde passei os melhores anos de minha existência. Pude viajar muito, conhecer novas realidades científicas, novas culturas, fazer grandes amizades, ser reconhecido como pesquisador no cobiçado cenário acadêmico, tornando-me assessor da direção da minha instituição e depois ocupando posições com projeção nacional e internacional. Deus me abençoou com capacidade cognitiva, liderança, respeitabilidade. Agora, quando completo mais um ano de vida, reconheço que sempre a mão do altíssimo esteve sobre minha vida, e por essa razão louvo ao meu bom Deus por tudo que me permitiu viver até a presente hora.

Hoje, depois ter caminhado por essa estrada chamada vida, posso retro ver que fui capaz de abençoar muitos que passaram pelo meu caminho. Formei mais de uma vintena de doutores e tenho, em todos, grandes amigos. Mas, olhando para o futuro, quero continuar sendo bênção, cada vez mais, de modo que o mundo possa sentir que estou nele. Meu grande sonho é continuar me desenvolvendo, para alcançar compreensão ainda mais aguda e profunda da realidade e, como consequência, poder ajudar ainda mais. Quero ajudar na transformação de pessoas, especialmente aquelas que me permitem o privilégio de sua amizade. É meu desejo poder catapulta-las a níveis de consecuções mais elevados e ter a certeza de que o mundo também melhorou por causa da existência dessas pessoas. Assim, vou continuar aprendendo e desenvolvendo o meu pequeno potencial para que compreendendo melhor nosso universo possa contribuir melhor para que outros vejam ainda mais perfeito que eu mesmo.


Senhor meu Deus, agradeço emocionado e com toda a minha capacidade de coração e alma, por todos os benefícios recebidos das Suas bondosas e poderosas mãos. Reconheço que se não fora a Sua presença constante, possivelmente meu caminho teria sido muito diferente. Por Sua interferência, às vezes, muito direta, o Senhor foi traçando a minha vida. Tudo o que sou e o que ainda serei, não dependeu e nem dependerá de mim, mas a Sua graça foi suficiente para que eu vivesse e me tornasse adulto. Meu desejo sincero é servir ao meu Deus todos os dias que ainda me restarem. Quero seguir as ordens do meu Deus e quero obedecer voluntariosamente ao que o Senhor ordenar. Obrigadíssimo Senhor por ter arquitetado minha estrada e estou pronto para seguir nas Suas mãos. Amem.

sexta-feira, 30 de setembro de 2016

COMO DEVEMOS ESPERAR?


O texto de Romanos 12:11-13 mostra um protocolo importante que deve ser utilizado pelos cristãos que esperam o retorno de Jesus: “Nunca lhes falte o zelo, sejam fervorosos no espírito, sirvam ao Senhor. Alegrem-se na esperança, sejam pacientes na tribulação, perseverem na oração. Compartilhem o que vocês têm com os santos em suas necessidades. Pratiquem a hospitalidade”. A primeira exigência é: tenham, os cristãos, zelo, significando afeição viva por algo, cuidado e interesse que carrega a diligência por qualquer serviço. É claro que há nas fileiras dos que esperam aqueles que não zelam. Mas, o texto ainda determina fervor no serviço, ou seja, grande dedicação ou ardor no serviço ao Senhor. Há ainda a assertiva positiva para que se mantenham a esperança e a paciência, uma vez que estando na contramão do mundo, virão tribulações e, nestes casos, a oração será o escape. O serviço é explicitamente explicado como sendo o atendimento das necessidades, especialmente as dos santos; aqueles irmãos na fé que com dignidade lutam sem alcançar os meios para resolverem seus próprios questionamentos.

Em resumo, o evangelho de Jesus não é uma religião intelectual esotérica da mente ou do espírito, de certa forma separada do corpo ou da vida real. Aguardar a segunda vinda de Jesus não é ficar num estado passivo, mas é uma postura ativa, na qual manifestamos o amor de Deus ao mundo de maneira prática. Tiago em sua carta (Tg 2:14-17) diz: “Meus irmãos, que aproveita se alguém disser que tem fé, e não tiver as obras? Porventura a fé pode salvá-lo? E, se o irmão ou a irmã estiverem nus, e tiverem falta de mantimento quotidiano, E algum de vós lhes disser: Ide em paz, aquentai-vos e fartai-vos; e não lhes derdes as coisas necessárias para o corpo, que proveito virá daí? Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma”. Não basta apenas crer, pois a crença deverá ser acompanhada de ação; nossas doutrinas precisam influenciar a maneira pela qual cumprimos a missão que o Senhor nos confiou.

Jesus explicou a fé que opera através da parábola do bom samaritano. Nessa história vemos três personagens cujos procedimentos definem o seu estado de ligação com o Reino de Deus. O levita e o sacerdote, os quais diziam ser especialmente ligados ao Reino, agiram de forma a negar a sua ligação. Já o samaritano, o qual era considerado pelos judeus como fora do Reino, demonstrou sua ligação de forma inequívoca.

Na carta de Tiago vemos que o sábio demonstra a sua sabedoria no seu procedimento. O autor acrescenta que devem os cristãos ser praticantes da palavra, e não apenas ouvintes; a fé sem as obras está morta. Ainda, o próprio Jesus ao pronunciar o sermão do monte disse: “Assim, brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos Céus” (Mt 5:16). Na verdade, Ele chama seus seguidores de “luz do mundo” afirmando que essa luz não deveria estar escondida (Mt 5:14). Para Jesus, aqueles que alegam crer nEle deveriam naturalmente demonstrar sua fé por meio do estilo de vida.

Uma das parábolas mais explicativas e instigantes sobre o processo da espera pelo retorno de Jesus é a das dez virgens. Estas esperavam pelo noivo para a festa das bodas. Essa parábola está ligada à do homem que entrou no ambiente das bodas sem a roupa adequada. As virgens são separadas em dois grupos: as prudentes e as néscias. Como demorasse o noivo, todas cansaram e dormiram, no entanto, as prudentes, possuíam óleo para alimentar suas lâmpadas. Óleo significa o Espírito Santo (Zacarias 4). Assim, as prudentes estavam cheias com o Espírito. Estar cheias com o Espírito significa que tinham conhecimento e, por esse motivo, tinham obras. As néscias (néscio é aquele que não sabe e, portanto, é irresponsável) não possuíam óleo, ou seja, nunca haviam tido zelo e ardor, estavam próximas da casa do noivo, mas essa proximidade não lhes conferia qualquer vantagem; não aproveitaram o tempo para prepararem mudança em seu status quo. Esse grupo representa uma parcela dos cristãos que estão nas igrejas por causa do convívio social, mas eles mesmos não aproveitam dessa estrutura para provocar mudanças pessoais. 

No capítulo 25 de Mateus, encontramos três parábolas contadas por Jesus, mas que possuem ensinamentos cumulativos.  Jesus destacou como devem os cristãos se ocupar ou “negociar” enquanto aguardam o Seu retorno. Primeiramente, a parábola das dez virgens instrui a certificar de que há óleo nas lâmpadas. Não basta apenas esperar o noivo, tem que haver modificação de comportamento. Em segundo lugar, a parábola dos talentos ordena a utilizar de maneira sábia os dons que o Senhor concedeu. A multiplicação dos dons é uma exigência, significando que a ajuda ao próximo é o grande investimento; influenciar pessoas provoca uma onda de influências que não para (o outro influencia a outro), fato que multiplica o capital inicial. Em terceiro lugar, a parábola das ovelhas e dos bodes faz lembrar de que a verdadeira religião, nas palavras do próprio Tiago, é “cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo” (Tg 1:27). Os verdadeiros seguidores de Jesus no tempo do fim são descritos como aqueles que alimentam o faminto, dão água ao sedento, são hospitaleiros com os estrangeiros, vestem o nu, cuidam dos doentes e visitam os que estão aprisionados (Mt 25:35, 36).

Em Mateus 24 há uma explicação sobre como não deve ser o procedimento dos cristãos enquanto esperam. Jesus descreveu como viviam as pessoas nos dias de Noé. Elas comiam, bebiam e se casavam – aparentemente alheios ao que estava para acontecer. Em outras palavras, aquelas pessoas estavam vivendo de modo despreocupado e negligente (cinco virgens néscias). Jesus disse que as coisas serão exatamente assim pouco antes de Sua segunda vinda: as pessoas estarão envolvidas em seus próprios interesses e atividades, esquecendo-se totalmente das necessidades dos seus semelhantes. Jesus então mandou que Seus discípulos vigiassem e estivessem preparados (Mt 24:42, 44). Por um lado, isso significa permanecer mentalmente e espiritualmente alerta ao fato de que Jesus voltará; no entanto, também significa mais do que isso. O anjo perguntou aos discípulos: “Por que vocês estão olhando para o céu? ” (At 1:11). Os discípulos tinham mais para fazer do que apenas ficar parados, olhando para o céu. Eles tinham uma obra a terminar; deviam cumprir a tarefa deixada por Jesus: “Negociai até que eu venha” (Lc 19:13). Quer significar que tinham de alcançar um caráter semelhante ao dEle e ensinar outros a buscar o aperfeiçoamento do caráter de acordo com os padrões celestes. Esta é a principal tarefa para os cristãos hoje.

A igreja cristã é o grande sistema criado por Deus para o aperfeiçoamento dos que esperam o retorno de Jesus. Todas as atividades que compõem a dinâmica do culto no cristianismo são de molde a levar à multiplicação dos dons. Há sempre estímulos para que haja progresso no conhecimento (conhecimento = graça) sobre Jesus, o modelo, buscando a formação de discípulos. Há sempre estímulos para ajuda aos necessitados, pois a fé que vem pelo ouvir deve desembocar em boas obras. As igrejas cristãs são verdadeiros centros de aprendizado onde cristãos são moldados à semelhança do Mestre. Uma vez adquirida a semelhança, devem os modificados ajudar na modificação de outros. Assim, os dons têm papel fulcral no desenvolvimento das comunidades cristãs, pois promovem complementações que deixam ver, no conjunto das pessoas, o rosto de Cristo.


Quanto aos pobres no contexto do Reino de Deus, a escritora Ellen White anota: “ Vi que está na providência de Deus que as viúvas e órfãos, os cegos, os surdos, os coxos e as pessoas afligidas de diferentes maneiras foram colocadas em íntima relação cristã com Sua igreja; isto visa provar o Seu povo e desenvolver-lhe o verdadeiro caráter. Anjos de Deus estão observando para ver como tratamos essas pessoas que necessitam nossa simpatia, amor e desinteressada benevolência. Este é o teste de Deus para o nosso caráter. Se temos a verdadeira religião da Bíblia, haveremos de sentir ser um débito de amor, bondade e interesse para com Cristo em favor de Seus irmãos; e não podemos fazer menos que mostrar nossa gratidão por Seu imensurável amor para conosco quando éramos nós ainda pecadores indignos, indignos de Sua graça, manifestando profundo interesse e amor altruístico pelos que são nossos irmãos menos afortunados que nós”. (Beneficência Social, p. 35). “A verdadeira simpatia entre o homem e o seu semelhante deve ser o sinal distintivo entre os que amam e temem a Deus e os que são indiferentes a Sua lei.... Ele foi um poder curador. “Misericórdia quero, e não sacrifício, ” disse Ele. Este foi o teste que o grande autor da verdade usou para distinguir entre a verdadeira religião e a falsa”. (Beneficência Social, p. 36).

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Adoração, Oração e Aprendizado

O ambiente da igreja cristã deveria ser suficiente para produzir e aumentar o contingente de pessoas com excelência no conjunto da sociedade. Em geral, as comunidades cristãs usam o modelo congregacional sem ter preocupação com o conceito de igreja conforme compreendido no hebraico, ou seja, o conceito de templo, significando o local para estudos de teologia, moral, comportamento.

Êxodo 25:8 “E me farão um santuário, e habitarei no meio deles”, define o caráter do templo: a casa ou o espaço feito pelo homem para Deus. O objetivo era que do templo irradiasse a moral celeste que nortearia o relacionamento entre homem e Deus e entre o homem e outro homem. E de fato assim foi. Nos primeiros momentos depois da inauguração do tabernáculo realizado por Moisés, a presença física de Deus era vista através do shekinah. A Torah foi escrita a partir das instruções dadas diretamente a Moisés, e este instruiu ao povo. O templo era, na verdade, um centro de ensino e aperfeiçoamento cognitivo que permaneceu ativo até o cativeiro babilônico, período em que surgiu o modelo da sinagoga. Esta tinha como objetivo manter a identidade nacional, sendo local de adoração, oração e aprendizado da palavra de Deus.

A igreja cristã surgiu como desdobramento do plano da redenção, uma evolução ou transição do próprio judaísmo para a nova fase pós sacrifício vicário do cordeiro de Deus, um período superior em elementos e conhecimentos, considerando que o próprio Deus, na pessoa do Filho, desceu para ensinar e demonstrar as altas exigências celestes relativas ao relacionamento Deus/homem e homem/homem, dando à igreja cristã novas interfaces e ritos consentâneos com a nova realidade ou fase do plano divino para a salvação, mas a mesma prerrogativa de disseminadora do conhecimento, tal qual o templo e a sinagoga.

A reforma protestante do século XVI foi um evento de singular significação. Reativou verdades bíblicas que estavam enterradas pelas tradições humanas oriundas do romanismo. Tais tradições, embora rechaçadas pelos protestantes de então, persistiram na memória, especialmente dos novos conversos, e chegaram até os nossos dias. A igreja protestante atual é tão romana que aceita mais enfaticamente as tradições humanas que as verdades bíblicas. Nos vários ramos do protestantismo veem-se preteridas, por exemplo, exigências do Antigo Testamento, sob o pretexto de uma nova dispensação, negando que o Novo Testamento seja uma explicação ou cumprimento de promessas do Velho Testamento, evidenciando incontestemente as tradições que buscam adequar verdades bíblicas a épocas e costumes que, na maioria dos casos, nada têm a ver com assertivas bíblicas. Tal situação sempre leva a uma deriva das verdades e, inevitavelmente, a uma decadência moral, porque sem profecia o povo se corrompe (Provérbios 29:18).

O que se verifica hoje na realidade das igrejas protestantes é que os membros usam o ambiente religioso para diversão. Buscam um bom palestrante, uma boa música, um bom ambiente social, transformando as igrejas em clubes. Mas, a principal função das igrejas é ser um polo de enraizamento nos conhecimentos cristãos, um difusor de cultura teológica, um local de adoração e oração. Todavia, as igrejas formam concentrações sociais para o exercício do poder temporal em todas as esferas de comandos que fazem parte do ambiente eclesial. São centros de concentração de poder e divertimento, uma decadência insuportável que alimenta as tradições humanas e torna a luta entre o bem e o mal vencível pelo inimigo.

Ainda que pretendam ser centros de difusão de conhecimento teológico, deixam muito a desejar, uma vez que não são ambientes de alta cognição. Há muita assimetria no nivelamento do conhecimento bíblico por parte dos líderes e membros, o que torna o ambiente eclesial um meio de cultura para o crescimento do raciocínio humano, quase sempre contrário às leis do Reino de Deus, ou seja, a ausência de simetria  no conhecimento das verdades bíblicas, leva ao surgimento de conflitos de ideias e de comportamentos, tornando o ambiente cristão instável e propício às dissensões e embates, justamente o que a lei de Deus proíbe. Por essa razão, numa mesma denominação, congregações irmãs produzem adoração e efeitos cultuais diferentes, levando a sérias crises existenciais e de identidade, o que a Bíblia denomina Babilônia, tornando impossível a homeostase necessária para quem pretende estar no contexto de Jerusalém, o sistema divino onde reina a paz. Em Apocalipse 18:4 há uma advertência: “...sai dela, povo meu...”.

O aprofundamento nas verdades celestes tão necessário à igreja cristã passa pela compreensão do papel da igreja, um sistema criado por Deus para enobrecimento dos homens e para seu crescimento até alcançar a estatura segundo a expectativa divina. A palavra de Deus estudada em profundidade torna o ambiente eclesial o caminho para o homem retornar ao estado original obtendo a imagem do criador.

Como corolário, vejamos o que ensina o livro Profetas e Reis (página 246) de Ellen White sobre o comportamento de Daniel no cativeiro babilônico: “Na aquisição da sabedoria dos babilônios, Daniel e seus companheiros foram muito melhor sucedidos que seus colegas; mas sua cultura não veio por acaso. Eles obtiveram o conhecimento mediante o fiel uso de suas faculdades, sob a guia do Espírito Santo. Colocaram-se em conexão com a Fonte de toda sabedoria, tornando o conhecimento de Deus o fundamento de sua educação. Oraram com fé por sabedoria, e viveram as suas orações. Puseram-se onde Deus poderia abençoá-los. Evitaram o que lhes poderia enfraquecer as faculdades, e aproveitaram toda oportunidade de se tornarem versados em todo ramo do saber. Seguiram as regras da vida que não poderiam falhar em dar-lhes força de intelecto. Procuraram adquirir conhecimento para um determinado propósito — para que pudessem honrar a Deus. Compreenderam que para poderem permanecer como representantes da verdadeira religião em meio das religiões falsas do paganismo, deviam possuir clareza de intelecto e aperfeiçoar o caráter cristão. E o próprio Deus era o seu professor. Orando constantemente, estudando conscienciosamente e mantendo-se em contato com o Invisível, andavam com Deus como andou Enoque”. 




segunda-feira, 8 de agosto de 2016

NOSSA DIMENSÃO NUMA SOCIEDADE DE PALAVRAS

O Salmo 8 é um dos mais significativos por ser uma análise do significado do homem:

“Ó SENHOR, Senhor nosso, quão admirável é o teu nome em toda a terra, pois puseste a tua glória sobre os céus! Tu ordenaste força da boca das crianças e dos que mamam, por causa dos teus inimigos, para fazer calar ao inimigo e ao vingador. Quando vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste; que é o homem mortal para que te lembres dele? E o filho do homem, para que o visites? Pois pouco menor o fizeste do que os anjos, e de glória e de honra o coroaste. Fazes com que ele tenha domínio sobre as obras das tuas mãos; tudo puseste debaixo de seus pés: todas as ovelhas e bois, assim como os animais do campo, as aves dos céus, e os peixes do mar, e tudo o que passa pelas veredas dos mares. Ó SENHOR, Senhor nosso, quão admirável é o teu nome sobre toda a terra!”

Ao escrever este salmo, o poeta bíblico se inspirou na vista do céu noturno com o fulgor do brilho da lua e das estrelas. Não é mencionado o sol. É provável que o espetáculo do céu estrelado produza no coração humano maior admiração e maravilha que o céu diurno, quando os ruídos, a poluição e as cenas da terra distraem a atenção.

O Seventh Day Adventist Bible Commentary explica que Enosh é um vocábulo hebraico usado para marcar a fragilidade humana. Quando uma pessoa contempla a imensidão, o mistério e a gloria dos céus noturnos, reflexiona no infinito espaço e nos inumeráveis corpos celestes, deve sentir-se como um ponto infinitesimal no universo.

Se olhar para os céus noturnos deixa uma marcante impressão nos mortais iletrados, quanto maior não há de ser a admiração dos que, aprovisionados com a crescente informação da astronomia moderna, contemplam o céu através de modernos observatórios!

O Seventh Day Adventist Bible Commentary diz que o salmista usa ainda a expressão o filho do homem,  do Hebraico ben-adam, para destacar a natureza terrena do homem, formado do pó da terra (Gênesis 1: 26; 2: 7). Por causa da sua formação, adverte o salmista, o que é o homem para que Deus o visite ou que se absorva por ele. Mas, um Deus essencialmente amoroso há de ter cuidado com o ser humano a despeito de ser também um Deus para os demais mundos.

Segundo o livro Testemunhos II de Ellen White, a importância do homem somente é percebida quando se toma em conta a morte de Cristo na cruz. O valor da alma humana está explícito no calvário (2 Test. p. 634, 635).

Se é importante a revelação de Deus nos fenômenos visíveis da natureza, mais importante ainda é sua revelação na vida humana. O tamanho e a extensão não são elementos de juízo suficientes para tributar o valor de alguma coisa. Tem-se dito que o olho e o cérebro que veem o firmamento são mais maravilhosos que os céus por eles contemplados através do telescópio mais poderoso.

Ainda no Seventh Day Adventist Bible Commentary encontramos que a afirmação do salmista “ser o homem é um pouco menor que os anjos”, no original hebraico me'elohim, significa literalmente, "um pouco menor que Deus". Os tárgumes (manuscritos do Velho Testamento em aramaico), a Septuaginta (LXX), as versões siríacas e a citação desta passagem em Hebreus 2:7 dizem "anjos" em vez de "Deus". Entretanto, as versões gregas de Aquila, Símaco e Teodocião, e também a Vulgata, trazem a tradução "Deus". Alguns consideram que a palavra Elohim poderia aplicar-se também a homens ou a anjos ( Exodo 21: 6; Salmo 82: 1). No entanto, Gesenio, aclamado como o pai dos gramáticos hebraicos traduz: "O fizeste com que lhe falte pouco de Deus"; vale dizer, "o fizestes só um pouco inferior a Deus". Não importa se lemos “menor que os anjos”, ou " menor que Deus"; é evidente que o homem está num plano muito superior ao do reino animal, devido a sua vinculação com Deus. Entretanto, no melhor dos casos, o homem finito é inferior ao Deus infinito. Todavia, na qualidade de senhor da Terra, o homem participa dos atributos de Deus, o rei do universo. Por isso foi revestido de honra e de glória.

É nesta condição que devemos nos apresentar diante de Deus. Assumindo posição destacada entre tantos, por causa da nossa origem. Somos elementos da sociedade humana, com capacidades para assumir posições e, em especial, comissionados para cuidar da maior responsabilidade dada aos mortais, a do bem-estar do próximo.

Espera a humanidade que tenhamos obtido conhecimento suficiente para desempenhar com brilhantismo e profissionalismo, as funções para as quais estamos aptos segundo os assentamentos bíblicos. Todavia, uma etapa mais alta deve ser alcançada, a do aperfeiçoamento, etapa na qual nosso desempenho deve estar focado no aprimoramento e especialização, na construção de pessoas das quais o mundo venha a se orgulhar e a desejar.

Todos os óbices ou lacunas sociais deverão ser encarados como desafios estimulantes que esperam por soluções. Nossa geração não poderá passar sem apresentar soluções, mas sempre haverá novos desafios e novos problemas. O homem formado à imagem de Deus tem o privilégio de ser um anjo enviado por Deus para minorar os sofrimentos do corpo e muitas vezes da alma.

A excelência exigirá aplicação aos estudos. Não abrir os livros, não procurar aperfeiçoamento em novos cursos, impedirá a compreensão do mundo e, consequentemente, a atuação como agente divino comissionado para auxiliar a sociedade.

Sendo que Deus deu aos homens honra, conforme nos disse o salmista, é nossa responsabilidade corresponder a esta honra concedida a priori. Mas, não somente corresponder à honra concedida, multiplica-la e entrega-la às gerações que nos sucederem. Nossa influência deverá ser forte o suficiente para construir uma nova geração ainda melhor que a nossa. O principal legado que homens podem deixar é a construção de outros homens ainda mais honrados e virtuosos, cheios de respeitoso espírito de cooperação.

Há algo que necessitamos compreender: a diferença entre dois conceitos frequentemente confundidos, poder e influência. Tendemos a pensar que são similares ou idênticos. Pensamos que pessoas de poder têm influência e pessoas de influência têm poder. Mas não é assim. Os dois são muito distantes e operam por lógicas muito diferentes.

Imaginemos que temos o poder total. Isto significa que o que nós dizemos assim será. Então um dia nós decidimos compartilhar nosso poder com nove outros. Agora, na melhor das hipóteses, temos um décimo do poder anterior. Agora nós decidimos compartilhar influência com nove dos nossos parceiros. Temos então dez vezes mais influência do que tínhamos antes, porque ao invés de somente nós há agora dez pessoas enviando a mesma mensagem.

O Poder trabalha por divisão, a influência por multiplicação.  O Poder, em outras palavras é um jogo de soma zero: quanto mais compartilhamos, menos temos. A Influência não é um jogo de soma zero: quanto mais compartilhamos mais nós temos.

Como vimos, há uma demarcação clara entre liderança como influência e liderança por poder. A Bíblia reconhece e afirma que todo poder pertence diretamente a Deus. Porém, a real liderança, aceita com louvor pela Bíblia, está na influência. Esta é a mais revolucionária ideia. Como exemplo, vejamos o judaísmo. Conforme assinalou o Rabino Jonathan Sacks, em seu livro Lessons in Leadership, foi a maior civilização a prever sua própria sobrevivência ancorada na educação, nas casas de estudo, e no aprendizado como experiência religiosa mais elevada do que a própria oração. A razão é que líderes são pessoas hábeis a mobilizar outras a agir de certas maneiras. O outro modo de conseguir liderança é entender as necessidades e aspirações das pessoas e ensina-las como consegui-las de modo conjunto, como um grupo. Isto é realizado através do poder da visão, força de personalidade, habilidade para articular compartilhamento de ideais em uma linguagem com a qual as pessoas estejam identificadas, e a capacidade de levantar muitos discípulos, os quais continuarão o trabalho no futuro.  O Poder diminui aqueles sobre quem é exercido. A Influência levanta e desenvolve pessoas.

Nem todos vamos obter poder, porque este é dado por Deus quem o possui, mas todos podemos ter influência. A mais importante forma de liderança não vem com títulos, prestígio, posição, roupas oficiais, mas com a prontidão ao serviço juntamente com outros, para buscar aquilo que não podemos alcançar sozinhos; falar, ouvir, ensinar, aprender tratar outras pessoas com respeito, mesmo as que são antagônicas a nós; explicar paciente e convincentemente por que cremos no que cremos e fazemos o que fazemos; encorajar outros a realizar os seus melhores esforços, e desafia-los a realizarem o seu melhor. Sempre escolher a influência antes do que o poder. Isto ajuda a mudar as pessoas as quais podem mudar outras pessoas; é assim que podemos mudar o mundo.

Nossa postura diante de Deus deve ser aquela de quem quer ser uma benção. Ninguém no mundo dos vivos existe somente para si. Por essa razão vivemos em sociedade; as cidades são formadas por muitas sociedades que adicionadas formam ambientes de trocas que produzem segurança. Juntos deslocamos o medo. Estamos mais seguros porque sabemos que há, na grande associação de pessoas, solução para a maioria os problemas. Neste contexto, a nossa participação na sociedade local deve considerar primeiramente que o nosso preparo deve ser esmerado para não diminuir a expectativa da segurança social, ou seja, devemos realizar o nosso melhor no sentido do serviço ao semelhante, e somente depois devemos pensar em recompensa, quer no sentido da honra, quer no sentido monetário. Há na sabedoria indiana o seguinte raciocínio: não corra atrás do dinheiro, deixe que o dinheiro corra atrás de você! Em outras palavras, devemos fazer o nosso dever da maneira mais completa e sábia possível, assim não teremos problemas financeiros.

No entanto, Nosso Mestre, Jesus Cristo, ensinou que para ter sucesso neste mundo, deveremos buscar em primeiro lugar o reino de Deus e a sua justiça, e todas as demais coisas nos serão acrescentadas.
A palavra-chave é justiça. Dar a outros o seu direito primário. Então temos dois ensinamentos nas palavras do Mestre: buscar o bem-estar daqueles que nos rodeiam aplicando-lhes a justiça; este é o primeiro ensino. O segundo é: todas as outras coisas serão acrescentadas.

Que Deus possa abençoar-nos com sabedoria, a primeira das grandes bênçãos; que Ele nos abençoe com saúde, a maior riqueza desta vida. Porém, a mais importante das bênçãos é ser aprovado por Deus; Ter diante de nós o rosto de Deus levantado em nossa direção e ter o sorriso dEle aprovando nosso dia a dia.


terça-feira, 24 de maio de 2016

Nossa Competência para Avaliar e Organizar Fatos


Um dos assuntos mais controvertidos no mundo cristão é o dos dons e ministérios, o qual tem emprego quase equivocado, especialmente entre o chamado mundo evangélico carismático. Não há muita clareza na interpretação dos textos do Novo Testamento que tratam do assunto, pois os teólogos, às vezes, buscam explicações com base em externalidades e não na profundidade dos textos.

A primeira questão que surge ao encarar-se o tema dos dons e ministérios é: por que estes são necessários? A maioria dos grupos religiosos assume uma postura imperiosamente mística quando tenta explicar a razão dos dons e torna quase incompreensível a operação de Deus, uma vez que não lidam com a base da questão. Proponho que vejamos essa dimensão do evangelho através da própria Bíblia.

Em Apocalipse 12:7-10 lemos: “ E houve batalha no céu; Miguel e os seus anjos batalhavam contra o dragão, e batalhavam o dragão e os seus anjos; Mas não prevaleceram, nem mais o seu lugar se achou nos céus. E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, chamada o Diabo, e Satanás, que engana todo o mundo; ele foi precipitado na terra, e os seus anjos foram lançados com ele. E ouvi uma grande voz no céu, que dizia: Agora é chegada a salvação, e a força, e o reino do nosso Deus, e o poder do seu Cristo; porque já o acusador de nossos irmãos é derrubado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite”. Tal batalha deu origem ao que a Bíblia denomina de o Grande Conflito; uma controvérsia que abalou o universo criado. Duas idéias estão em debate; dois tipos de governos estão propostos; de um lado está o soberano do universo, Deus todo poderoso, cuja base do governo é a sua lei, com dois grandes princípios: amor a Deus e amor ao próximo. Estes princípios formam um sistema harmônico de ações, onde as criaturas ou inteligências habitando os vários planetas são instadas a cooperar através do desenvolvimento de virtudes individuais que as fortalece moralmente, sendo que os indivíduos passam a operar num alto nível de colaboração e harmonia. Quanto mais elevada é a harmonia, mais forte e consolidado é o Reino de Deus. Neste sentido, o imperativo do Reino é que os súditos sejam moralmente bem constituídos e possam assumir um forte grau de independência do poder central, de tal modo que, cada um pode ser auxílio ao outro, num sistema onde Deus é o grande provedor, mas as criaturas possuem autonomia para administrar umas às outras as necessidades comuns. O Reino de Deus é forte, na razão direta da autonomia dos seus súditos.

De outro lado, a proposta de Lucifer, denominado de a serpente, é diametralmente oposta. Ele propôs um sistema onde a divisão é o motor que impulsiona. Não há cooperação no sentido do crescimento do outro, mas cooperação negativa apenas para que um possa se desenvolver em detrimento de outros, um sistema de concorrência e de predação. A finalidade é fazer com que apenas um líder tenha força e os demais dependam profundamente da liderança. Nesse sistema de governo, o enfraquecimento dos súditos significa o fortalecimento do rei. Assim, dividir representa aumentar o nível de dependência. Tal sistema opera tendo o egoísmo como motor impulsionador. Assim, vemos que o universo outrora harmônico, com o surgimento do grande conflito, tornou-se dividido. Porém, é fundamental verificar que de todos os planetas criados, somente a Terra aderiu ao sistema onde a divisão é a base.

Desde que a serpente foi expulsa do céu, Deus vem trabalhando para restabelecer o sistema da harmonia. Assim, vejamos como têm acontecido as ações divinas sobre a Terra e qual tem sido o resultado.

Adão foi cooptado para o sistema da divisão e, uma vez implantado, tudo ficou afetado por ele. A primeira consequência foi a expulsão de Adão do paraíso. Adão torna-se separado de Deus e perde todas as características que havia recebido de Deus e que o tornara semelhante a Deus. O sistema da divisão operou o primeiro homicídio; quando Deus interpela Cain sobre a segurança do irmão, ele responde que não é o guardador do irmão. Se buscarmos a história, veremos que o sistema da divisão abalou as relações humanas; Jacó e Esaú não cooperam entre si; José e os irmãos se desentendem e, a Bíblia vai apresentando uma sucessão de desarmonias sociais que alçam nossos dias. O sistema de Deus foi substituído, a harmonia deu lugar à divisão.

Considerando que, todos os homens tornaram-se escravos de Satanás, ou seja, estão sob o domínio da divisão, do orgulho e da dissensão, então o céu passou a trabalhar no sentido de devolver a harmonia. No entanto, dado que o homem não possui a harmonia em si mesmo, são necessárias doações de virtudes celestes para que sejam restabelecidas a harmonia e a felicidade. Como podemos enxergar as ações de Deus na história humana para restaurar a harmonia?

Vamos tomar como ponto de partida a construção do tabernáculo no deserto. O livro Patriarcas e Profetas (Ellen White), à página 245 comenta: “Homens escolhidos foram especialmente dotados por Deus de habilidade e sabedoria para a construção do sagrado edifício. O próprio Deus deu a Moisés o plano daquela estrutura, com instruções específicas quanto ao seu tamanho e forma, materiais a serem empregados, e cada peça que fazia parte do aparelhamento que deveria a mesma conter. Os lugares santos, feitos a mão, deveriam ser ‘figura do verdadeiro’, ‘figuras das coisas que estão no Céu’ (Hebreus 9:24, 23) — uma representação em miniatura do templo celestial, onde Cristo, nosso grande Sumo Sacerdote, depois de oferecer Sua vida em sacrifício, ministraria em prol do pecador. Deus expôs perante Moisés, no monte, uma visão do santuário celestial, e mandou-lhe fazer todas as coisas de acordo com o modelo a ele mostrado. Todas estas instruções foram cuidadosamente registradas por Moisés, que as comunicou aos chefes do povo. [...] “E todas as mulheres sábias de coração fiavam com as suas mãos, e traziam o fiado, o azul e a púrpura, o carmesim, e o linho fino. E todas as mulheres, cujo coração as moveu em sabedoria, fiavam os pêlos das cabras. O comentário acima está baseado em Êxodo 31.

A informação acima é de grande importância para a compreensão do raciocínio que virá. Se o tabernáculo deveria ser uma representação da realidade celeste, e se os construtores eram homens submetidos não ao sistema de Deus, mas ao sistema da divisão, então é obvio que a compreensão da realidade superior do céu não poderia ser alcançada por eles. Neste sentido, Deus os dota de sabedoria especial para que pudessem perceber o conceito do sistema divino de cooperação e, consequentemente, tivessem como construir o tabernáculo. O que estamos verificando é que para haver comunicação entre Deus e os homens, é necessário que ferramentas ou virtudes morais sejam confiadas, de modo que haja elevação moral para que homens possam lidar com a realidade celeste.

A essa altura já podemos entender a razão dos dons doados à igreja. Esta é a exibição cósmica da vitória de Deus sobre o espírito de divisão que Satanás introduziu no universo no princípio do grande conflito. O mínimo que os membros do corpo de Cristo – a igreja – podem fazer é parecer unidos e leais aos propósitos eternos de Deus.

Agora, analisemos dois textos importantes para entender os dons e ministérios. O primeiro deles está em I Coríntios 12:1-12: “ Acerca dos dons espirituais, não quero, irmãos, que sejais ignorantes. Vós bem sabeis que éreis gentios, levados aos ídolos mudos, conforme éreis guiados. Portanto, vos quero fazer compreender que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: Jesus é anátema, e ninguém pode dizer que Jesus é o SENHOR, senão pelo Espírito Santo. Ora, há diversidade de dons, mas o Espírito é o mesmo. E há diversidade de ministérios, mas o Senhor é o mesmo. E há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos. Mas a manifestação do Espírito é dada a cada um, para o que for útil. Porque a um pelo Espírito é dada a palavra da sabedoria; e a outro, pelo mesmo Espírito, a palavra da ciência; e a outro, pelo mesmo Espírito, a fé; e a outro, pelo mesmo Espírito, os dons de curar; e a outro a operação de maravilhas; e a outro a profecia; e a outro o dom de discernir os espíritos; e a outro a variedade de línguas; e a outro a interpretação das línguas. Mas um só e o mesmo Espírito opera todas estas coisas, repartindo particularmente a cada um como quer. Porque, assim como o corpo é um, e tem muitos membros, e todos os membros, sendo muitos, são um só corpo, assim é Cristo também”.  

No verso três vemos que homens submetidos ao sistema da divisão, mas que podem ser guiados por Deus podem reconhecer o funcionamento do sistema da harmonia. A estes são enviados sabedoria e conhecimento. Sabedoria aqui é uma palavra que vem do Hebraico, jokmah. Aparece 141 vezes no Antigo Testamento e quase sempre se traduz como "sabedoria". Jokmah abarca uma quantidade de ideias: (1) perícia técnica (Exo. 28: 3; 35: 26; 1 Reis. 7: 14); (2) talento, sagacidade (1 Reis. 2: 6; 3: 28; Job 39: 17; Isa. 10: 13; 29: 14); (3) sabedoria terrenal prática (1 Reis. 4: 30; Isa. 47: 10); (4) sabedoria piedosa (Deut. 4: 6; Sal. 37: 30; 90: 12; Prov. 10: 31; Isa. 33: 6; Jer. 8: 9); (5) sabedoria como um atributo de Deus (Sal. 104: 24; Prov. 3: 19; Jer. 10: 12; 51: 15); (6) sabedoria divina personificada (Prov. 8: 1-36; 9: 1-6); (7) sabedoria humana ideal (Sal. 111: 10; Prov. 1: 2), etc. A "sabedoria" se distingue do "conhecimento" (Hebráico dá'ath), em que "sabedoria" está ligada ao caráter e a conduta, enquanto que "conhecimento" se refere principalmente à cultura intelectual. O conhecimento pede ser só uma acumulação de fatos desconexos, sem a capacidade de aplica-los à vida prática. Por outro lado, a sabedoria é a faculdade que permite aplicar os fatos na vida prática. Neste entendimento ou compreensão está implícita a capacidade de avaliar e organizar fatos, condição essencial para alcançar a sabedoria. A sabedoria, tão encalcada no livro dos Provérbios, é perspicácia prática tal como a que se revela nos ideais morais e no caráter religioso. Os diversos aspectos da sabedoria correspondem com as características do que está à altura das normas de Deus. A sabedoria que descreve Salomão é abarcante no sentido de que cobre todas as fases da vida prática. Não separa a piedade dos deveres comuns da vida. O que tem a verdadeira sabedoria, reflete os requerimentos de Deus em cada pensamento e ato.

O segundo texto está em Efésios 4:8-16: “Por isso diz: Subindo ao alto, levou cativo o cativeiro, E deu dons aos homens. Ora, isto ele subiu que é, senão que também antes tinha descido às partes mais baixas da terra? Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para cumprir todas as coisas. E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo; até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo, para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente. Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor”.

Vejamos primeiramente o que está no verso oito, “subindo ao alto, levou cativo o cativeiro”. O texto refere-se a Jesus que subiu ao alto; ora quem sobe já está no alto, então porque subindo ao alto? Porque as coisas altas estão no reino da harmonia onde a lei de Deus é a base das ações, as coisas baixas são aquelas do reino da divisão, daí ter Ele subido ao alto. Mas, diz-nos que levou cativo o cativeiro, ou seja, aquilo que nos oprimia, o sistema ao qual fomos escravizados e encantados, este Ele levou cativo. O texto nos informa que a ascensão de Cristo determinou que qualquer homem que não mais queira estar no domínio da divisão poderá transferir-se para o sistema da harmonia. A continuação verso oito informa que, por causa de ter colocado em cativeiro o sistema do inimigo, pode agora distribuir dons ou virtudes que são necessários aos que estão no reino da harmonia.

Ora, as virtudes são para edificação do corpo de Cristo. Homens que viveram no sistema da divisão devem agora aprender a operar o sistema da harmonia; até que todos cheguemos à unidade da fé, não mais em disputa, mas em cooperação, até que todos alcancem o conhecimento do Filho de Deus, dominem aquilo que somente Jesus sabia, cheguem a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo, para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente. Perguntamos agora qual é o engano frauduloso dos homens?

Há no mundo cristão aqueles que advogam que a lei dos dez mandamentos foi abolida com a morte de Jesus. Mas esta afirmação não encontra respaldo no texto de Efésios 4, considerando que Jesus levou cativo o sistema da divisão. Os cristãos explicam que agora vivemos no império da graça, onde tudo é permitido porque Jesus cumpriu a lei por nós. Tal raciocínio é estrábico em relação à realidade do texto. Se Jesus subiu ao alto e levou cativo o cativeiro, se todo homem agora é livre para optar entre dois sistemas, se o sistema de Deus é o da harmonia, ou seja, um sistema que pressupõe amor a Deus e amor ao próximo, então a lei não foi abolida. Consequentemente, todo sistema religioso cristão que não advoga a harmonia através da lei é falso ou fraudulento, pois tenta estar no reino de Deus, mas opera pelo sistema da divisão. De fato, especialmente entre os evangélicos, há proliferação de igrejas onde a principal meta é obter vantagens neste mundo. Tal miscelânea é um sincretismo que a Bíblia chama de Babilônia. Assim, os dons são dados aos homens para que estes cresçam e alcancem a estatura de Cristo o qual viveu sem pecado, pois guardou a lei, sendo que pecado é a transgressão da lei (Romanos 2:23).

Agora vejamos como estes dons operam para o crescimento da igreja. Nenhum dom que possamos ter – seja ensino, seja pregação, evangelismo, cura, aconselhamento, visitação, consolação, socorro – deve ser reservado para uso pessoal. Todos eles são designados para o bem coletivo e o crescimento da igreja, caso contrário, os detentores terão seus dons retirados (Mat.25:24-30). O dom da palavra é um talento que deve ser cultivado cuidadosamente. De todos os dons que recebemos de Deus, nenhum é capaz de se tornar maior bênção que este. Com a voz convencemos e persuadimos, com ela elevamos orações e louvores a Deus, e também falamos a outros do amor do Redentor. Que importância tem, pois, que seja bem educada a fim de tornar-se mais eficaz para o bem! A cultura e o correto uso da voz são grandemente negligenciados até por pessoas de inteligência e de atividade cristã. (Parábolas de Jesus, p178). Toda alma está circundada de uma atmosfera própria, que pode estar carregada do poder vivificante da fé, do ânimo, da esperança, e perfumada com a fragrância do amor. Ou pode estar pesada e fria com as nuvens do descontentamento e egoísmo, ou intoxicada com o contato mortal de um pecado acariciado. Pela atmosfera que nos envolve, toda pessoa com quem nos comunicamos é consciente ou inconscientemente afetada. Esta é uma responsabilidade de que não nos podemos livrar. Nossas palavras, nossos atos, nosso traje, nosso procedimento, até a expressão fisionômica tem sua influência. (Parábolas de Jesus, p.180). O dinheiro é de grande valor, porque pode realizar grande bem. Nas mãos dos filhos de Deus é alimento para o faminto, água para o sedento, vestido para o nu. É proteção para o opresso, e meio para socorrer o enfermo. Mas o dinheiro não é de mais valor que a areia, a não ser que o empreguemos para prover as necessidades da vida, para bênção de outros, e para o desenvolvimento da obra de Cristo.  Ninguém suponha que possa viver vida de egoísmo, e então, tendo servido aos próprios interesses, entrar no gozo do Senhor. Não puderam participar da alegria de um amor desinteressado. Não se adaptariam às cortes celestes. Não poderiam apreciar a pura atmosfera de amor que impregna o Céu. As vozes dos anjos e a música de suas harpas não lhes agradariam. Para sua mente a ciência do Céu seria um enigma. (Parábolas de Jesus, p.197).

No evangelho de Marcos 4:30, lemos que Jesus não encontrou na sociedade humana nada com que pudesse comparar o reino de Deus, uma vez que os reinos da Terra se regem pela supremacia do poder físico. “Mas no reino de Cristo não existe arma carnal nem instrumento de coerção. Esse reino deve erguer e enobrecer a humanidade. A igreja de Deus é o recinto de vida santa, plena de variados dons e dotada com o Espírito Santo. Os membros devem encontrar sua felicidade na felicidade daqueles a quem ajudam e abençoam” (Atos dos Apóstolos, p7).

 










quinta-feira, 19 de maio de 2016

A Capacidade de Ser Único


No evangelho de Lucas no capítulo 21:25-27 lemos: “E haverá sinais no sol e na lua e nas estrelas; e na terra angústia das nações, em perplexidade pelo bramido do mar e das ondas. Homens desmaiando de terror, na expectação das coisas que sobrevirão ao mundo; porquanto as virtudes do céu serão abaladas. E então verão vir o Filho do homem numa nuvem, com poder e grande glória”.

Estamos presenciando atualmente grandes sinais na natureza, mudanças climáticas, e na sociedade humana, ondas migratórias dirigidas por grandes incertezas sócio-políticas, grupos armados tirando a paz de milhares, fora a instabilidade social causada pela anomia que assombra as grandes cidades. Literalmente homens desmaiando de terror.

Qual será a origem dessa precariedade? Nosso planeta está submetido às tradições humanas que levam pessoas a serem orientadas para religiões que apenas operam externalidades, não enxergando o âmago do problema: desobediência à Lei de Deus.

O princípio da Lei é o interesse pelo próximo. Harmonia é a palavra que traduz esse princípio. A partir do momento em que o homem desobedeceu a Lei, estabeleceu-se um sistema de divisão e desunião. A Lei está calcada no princípio da unicidade, ou seja, a capacidade de ser único ou formar todos indivisíveis.

A criação foi uma gigantesca demonstração do princípio da unicidade. Litosfera, biosfera e atmosfera existem como unidade. Uma parte não funciona sem a outra e são, por essa característica, unidade singular. O ciclo das águas na superfície da Terra é outro exemplo de unicidade. As águas que evaporam voltam à Terra e formam um conjunto único. Todos os mananciais de águas têm uma origem, os oceanos. De outro lado, ainda que nas condições de pecado, a unicidade pode ser vista: o ciclo da cadeia alimentar, conforme o entendemos, é um forte exemplo, todos os nutrientes que estão presos nas grades estruturais dos seres vivos serão decompostos após a sua morte e tornarão a fazer parte de grade estrutural de outros seres vivos, num ciclo contínuo ininterrupto, até que a Terra chegue ao seu final.

 O fundamento da unicidade está no macro universo, onde as galáxias orbitam em torno de outras galáxias, de modo a manter um fino equilíbrio gravitacional que mantém o cosmo coeso. Do mesmo modo, a estrutura atômica funciona equilibrada tendo os elétrons orbitando o núcleo atômico, equilíbrio mantido pela força eletrostática. Se vamos ao interior da célula, o núcleo celular onde está o DNA, vemos as duas fitas deste formando uma hélice. Tais fitas são formadas por açucares (ribose) onde estão as bases púricas e pirimídicas (Timina, Guanina, Citosina, Adenina, Uracila) que se ligam entre si por pontes de hidrogênio para formar a complexidade do DNA.

Deus foi o criador de tudo e, consequentemente, esse princípio da unicidade é encontrado nEle. São três pessoas formando o que chamamos de Deus: Pai, Filho e Santo Espírito. O Pai não é o Filho e este não é o Espírito Santo, mas os três formam uma unicidade incomum para governar tudo. Estamos falando de uma unidade de três pessoas que formam o Deus infinito e que está além da compreensão humana, mas é conhecido por sua auto revelação (Deut.6:1; Mat.28:19; 2Cor.13:13; etc.).

Na criação do homem vemos o princípio da unicidade transferido. Este é formado por três partes: corpo, alma e espírito. Esta composição é ratificada por Paulo na sua primeira carta aos Tessalonicenses, capítulo 5:23 quando afirma: “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso SENHOR Jesus Cristo. Estas três partes devem agir unidas, do contrário causarão infelicidade. Por exemplo, se o espírito trabalha contra o corpo, prejudica a alma. Salomão denuncia isto em Provérbios 1:19 “São assim as veredas de todo aquele que usa de cobiça: ela põe a perder a alma dos que a possuem”. Do mesmo modo, se afetamos ou destruímos o corpo prejudicaremos o funcionamento da alma. Isto está demonstrado em Levíticos 20:25 “Fareis, pois, diferença entre os animais limpos e imundos, e entre as aves imundas e as limpas; e as vossas almas não fareis abomináveis por causa dos animais, ou das aves, ou de tudo o que se arrasta sobre a terra; as quais coisas apartei de vós, para tê-las por imundas”. Assim, percebemos que a inquietação humana é o resultado da quebra da unicidade do homem. No estado de pecador, a não observância da Lei leva ao estado de desequilíbrio das três dimensões, provocando o paradoxo humano; queremos fazer o bem, mas praticamos o mal.

Em Hebreus 4:12 lemos “Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração”. Esta afirmação é útil para explicar o que Deus tenta fazer conosco, ou seja, o reequilíbrio do homem. A situação atual é melhor entendida se olharmos o início. “Adão estava diante de Deus na força da perfeita varonilidade, tendo todos os órgãos e faculdades de seu ser plenamente desenvolvidos e harmoniosamente equilibrados. Achava-se ele circundado de coisas belas e conversava diariamente com os santos anjos (Verdade sobre os Anjos, p.49). Em outro trecho do livro O Grande Conflito, à página 83, Ellen White explica: “O homem e a mulher foram formados à imagem de Deus, com individualidade, poder e liberdade de pensar e agir. Conquanto tenham sido criados como seres livres, cada um é uma unidade indivisível de corpo, mente e espírito, e dependente de Deus quanto à vida, respiração e tudo o mais. Quando nossos primeiros pais desobedeceram a Deus, eles negaram sua dependência dEle e caíram de sua elevada posição abaixo de Deus. A imagem de Deus, neles, foi desfigurada, e tornaram-se sujeitos à morte. Seus descendentes partilham dessa natureza caída e de suas conseqüências. Eles nascem com fraquezas e tendências para o mal. Mas Deus, em Cristo, reconciliou consigo o mundo e por meio de Seu Espírito restaura nos mortais penitentes a imagem de seu Criador. (Gênesis 1:26-28; 2:7; Salmos 8:4-8; Atos dos Apóstolos 17:24-28; Gênesis 3; Salmos 51:5; Romanos 5:12-17; 2 Coríntios 5:19, 20; Salmos 51:10; 1 João 4:7, 8, 11, 20; Gênesis 2:15.).

Para restaurar a imagem de Deus na humanidade o céu fez um plano que se desenvolveu desde que nossos pais saíram do Éden. Tal plano foi pensado para aproximar um Deus transcendente a uma humanidade imanente. Assim, a imanência de Deus tornou-se mais sentida no tabernáculo do deserto, quando a presença física de Deus era vista no lugar santíssimo, através do resplendor do Shekhinah. Porém, Deus tornou-se ainda mais imanente quando entregou a Moisés a sua palavra, a Torá, a qual poderia tornar a imanência de dEle cabal pois a palavra estaria na mente do homem. Esta espada de dois gumes que penetra na intimidade do ser agiria para reequilibrar as três dimensões. No entanto, o ato mais crítico e mais importante da imanência de Deus foi a encarnação de Jesus Cristo.  Ele se tornou um com os homens, era o Deus entre os homens e, nesta condição, poderia ensinar pessoalmente a humanidade no caminho do retorno ao equilíbrio ou à imagem de Deus. Se Deus tornara-se um com os homens, os homens poderiam tornar-se um com Deus; estaria de volta a unicidade perdida no Éden.

No entanto, Cristo não permaneceu com a humanidade e voltou para o céu. A pergunta que se levanta é: o princípio da unicidade foi quebrado? Essa questão foi resolvida com a criação da igreja cristã. A Igreja é um corpo com muitos membros, chamados de toda nação, tribo, língua e povo. Em Cristo somos uma nova criação; distinções de raça, cultura e nacionalidade, e diferenças entre altos e baixos, ricos e pobres, homens e mulheres, não devem ser motivo de dissensões entre nós. Todos somos iguais em Cristo, o qual por um só Espírito nos uniu numa comunhão com Ele e uns com os outros; devemos servir e ser servidos sem parcialidade ou restrição. Mediante a revelação de Jesus Cristo nas Escrituras, partilhamos a mesma fé e esperança, e estendemos um só testemunho para todos. Esta unidade encontra sua fonte na unidade do Deus triúno, que nos adotou como Seus filhos. (Romanos 12:4, 5; 1 Coríntios 12:12-14; Mateus 28:19, 20; Salmos 133:1; 2 Coríntios 5:16, 17; Atos dos Apóstolos 17:26, 27; Gálatas 3:27, 29; Colossences 3:10-15; Efésios 4:14-16; 4:1-6; João 17:20-23).

É propósito de Deus que haja unidade entre Seus filhos. [...] A união faz a força; a desunião enfraquece. Unidos uns aos outros, trabalhando juntos, em harmonia, pela salvação dos homens, seremos na verdade “cooperadores de Deus”. 1 Coríntios 3:9. Os que se recusam a trabalhar em boa harmonia desonram grandemente a Deus. O inimigo deleita-se em vê-los trabalhando para fins mutuamente contrários. Essas pessoas precisam cultivar o amor fraternal e a ternura de coração. Se pudessem correr a cortina que lhes vela o futuro e ver o resultado de sua desunião, por certo seriam levados a arrepender-se (Conselhos para Igreja, p.42).