sexta-feira, 30 de setembro de 2016

COMO DEVEMOS ESPERAR?


O texto de Romanos 12:11-13 mostra um protocolo importante que deve ser utilizado pelos cristãos que esperam o retorno de Jesus: “Nunca lhes falte o zelo, sejam fervorosos no espírito, sirvam ao Senhor. Alegrem-se na esperança, sejam pacientes na tribulação, perseverem na oração. Compartilhem o que vocês têm com os santos em suas necessidades. Pratiquem a hospitalidade”. A primeira exigência é: tenham, os cristãos, zelo, significando afeição viva por algo, cuidado e interesse que carrega a diligência por qualquer serviço. É claro que há nas fileiras dos que esperam aqueles que não zelam. Mas, o texto ainda determina fervor no serviço, ou seja, grande dedicação ou ardor no serviço ao Senhor. Há ainda a assertiva positiva para que se mantenham a esperança e a paciência, uma vez que estando na contramão do mundo, virão tribulações e, nestes casos, a oração será o escape. O serviço é explicitamente explicado como sendo o atendimento das necessidades, especialmente as dos santos; aqueles irmãos na fé que com dignidade lutam sem alcançar os meios para resolverem seus próprios questionamentos.

Em resumo, o evangelho de Jesus não é uma religião intelectual esotérica da mente ou do espírito, de certa forma separada do corpo ou da vida real. Aguardar a segunda vinda de Jesus não é ficar num estado passivo, mas é uma postura ativa, na qual manifestamos o amor de Deus ao mundo de maneira prática. Tiago em sua carta (Tg 2:14-17) diz: “Meus irmãos, que aproveita se alguém disser que tem fé, e não tiver as obras? Porventura a fé pode salvá-lo? E, se o irmão ou a irmã estiverem nus, e tiverem falta de mantimento quotidiano, E algum de vós lhes disser: Ide em paz, aquentai-vos e fartai-vos; e não lhes derdes as coisas necessárias para o corpo, que proveito virá daí? Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma”. Não basta apenas crer, pois a crença deverá ser acompanhada de ação; nossas doutrinas precisam influenciar a maneira pela qual cumprimos a missão que o Senhor nos confiou.

Jesus explicou a fé que opera através da parábola do bom samaritano. Nessa história vemos três personagens cujos procedimentos definem o seu estado de ligação com o Reino de Deus. O levita e o sacerdote, os quais diziam ser especialmente ligados ao Reino, agiram de forma a negar a sua ligação. Já o samaritano, o qual era considerado pelos judeus como fora do Reino, demonstrou sua ligação de forma inequívoca.

Na carta de Tiago vemos que o sábio demonstra a sua sabedoria no seu procedimento. O autor acrescenta que devem os cristãos ser praticantes da palavra, e não apenas ouvintes; a fé sem as obras está morta. Ainda, o próprio Jesus ao pronunciar o sermão do monte disse: “Assim, brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos Céus” (Mt 5:16). Na verdade, Ele chama seus seguidores de “luz do mundo” afirmando que essa luz não deveria estar escondida (Mt 5:14). Para Jesus, aqueles que alegam crer nEle deveriam naturalmente demonstrar sua fé por meio do estilo de vida.

Uma das parábolas mais explicativas e instigantes sobre o processo da espera pelo retorno de Jesus é a das dez virgens. Estas esperavam pelo noivo para a festa das bodas. Essa parábola está ligada à do homem que entrou no ambiente das bodas sem a roupa adequada. As virgens são separadas em dois grupos: as prudentes e as néscias. Como demorasse o noivo, todas cansaram e dormiram, no entanto, as prudentes, possuíam óleo para alimentar suas lâmpadas. Óleo significa o Espírito Santo (Zacarias 4). Assim, as prudentes estavam cheias com o Espírito. Estar cheias com o Espírito significa que tinham conhecimento e, por esse motivo, tinham obras. As néscias (néscio é aquele que não sabe e, portanto, é irresponsável) não possuíam óleo, ou seja, nunca haviam tido zelo e ardor, estavam próximas da casa do noivo, mas essa proximidade não lhes conferia qualquer vantagem; não aproveitaram o tempo para prepararem mudança em seu status quo. Esse grupo representa uma parcela dos cristãos que estão nas igrejas por causa do convívio social, mas eles mesmos não aproveitam dessa estrutura para provocar mudanças pessoais. 

No capítulo 25 de Mateus, encontramos três parábolas contadas por Jesus, mas que possuem ensinamentos cumulativos.  Jesus destacou como devem os cristãos se ocupar ou “negociar” enquanto aguardam o Seu retorno. Primeiramente, a parábola das dez virgens instrui a certificar de que há óleo nas lâmpadas. Não basta apenas esperar o noivo, tem que haver modificação de comportamento. Em segundo lugar, a parábola dos talentos ordena a utilizar de maneira sábia os dons que o Senhor concedeu. A multiplicação dos dons é uma exigência, significando que a ajuda ao próximo é o grande investimento; influenciar pessoas provoca uma onda de influências que não para (o outro influencia a outro), fato que multiplica o capital inicial. Em terceiro lugar, a parábola das ovelhas e dos bodes faz lembrar de que a verdadeira religião, nas palavras do próprio Tiago, é “cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo” (Tg 1:27). Os verdadeiros seguidores de Jesus no tempo do fim são descritos como aqueles que alimentam o faminto, dão água ao sedento, são hospitaleiros com os estrangeiros, vestem o nu, cuidam dos doentes e visitam os que estão aprisionados (Mt 25:35, 36).

Em Mateus 24 há uma explicação sobre como não deve ser o procedimento dos cristãos enquanto esperam. Jesus descreveu como viviam as pessoas nos dias de Noé. Elas comiam, bebiam e se casavam – aparentemente alheios ao que estava para acontecer. Em outras palavras, aquelas pessoas estavam vivendo de modo despreocupado e negligente (cinco virgens néscias). Jesus disse que as coisas serão exatamente assim pouco antes de Sua segunda vinda: as pessoas estarão envolvidas em seus próprios interesses e atividades, esquecendo-se totalmente das necessidades dos seus semelhantes. Jesus então mandou que Seus discípulos vigiassem e estivessem preparados (Mt 24:42, 44). Por um lado, isso significa permanecer mentalmente e espiritualmente alerta ao fato de que Jesus voltará; no entanto, também significa mais do que isso. O anjo perguntou aos discípulos: “Por que vocês estão olhando para o céu? ” (At 1:11). Os discípulos tinham mais para fazer do que apenas ficar parados, olhando para o céu. Eles tinham uma obra a terminar; deviam cumprir a tarefa deixada por Jesus: “Negociai até que eu venha” (Lc 19:13). Quer significar que tinham de alcançar um caráter semelhante ao dEle e ensinar outros a buscar o aperfeiçoamento do caráter de acordo com os padrões celestes. Esta é a principal tarefa para os cristãos hoje.

A igreja cristã é o grande sistema criado por Deus para o aperfeiçoamento dos que esperam o retorno de Jesus. Todas as atividades que compõem a dinâmica do culto no cristianismo são de molde a levar à multiplicação dos dons. Há sempre estímulos para que haja progresso no conhecimento (conhecimento = graça) sobre Jesus, o modelo, buscando a formação de discípulos. Há sempre estímulos para ajuda aos necessitados, pois a fé que vem pelo ouvir deve desembocar em boas obras. As igrejas cristãs são verdadeiros centros de aprendizado onde cristãos são moldados à semelhança do Mestre. Uma vez adquirida a semelhança, devem os modificados ajudar na modificação de outros. Assim, os dons têm papel fulcral no desenvolvimento das comunidades cristãs, pois promovem complementações que deixam ver, no conjunto das pessoas, o rosto de Cristo.


Quanto aos pobres no contexto do Reino de Deus, a escritora Ellen White anota: “ Vi que está na providência de Deus que as viúvas e órfãos, os cegos, os surdos, os coxos e as pessoas afligidas de diferentes maneiras foram colocadas em íntima relação cristã com Sua igreja; isto visa provar o Seu povo e desenvolver-lhe o verdadeiro caráter. Anjos de Deus estão observando para ver como tratamos essas pessoas que necessitam nossa simpatia, amor e desinteressada benevolência. Este é o teste de Deus para o nosso caráter. Se temos a verdadeira religião da Bíblia, haveremos de sentir ser um débito de amor, bondade e interesse para com Cristo em favor de Seus irmãos; e não podemos fazer menos que mostrar nossa gratidão por Seu imensurável amor para conosco quando éramos nós ainda pecadores indignos, indignos de Sua graça, manifestando profundo interesse e amor altruístico pelos que são nossos irmãos menos afortunados que nós”. (Beneficência Social, p. 35). “A verdadeira simpatia entre o homem e o seu semelhante deve ser o sinal distintivo entre os que amam e temem a Deus e os que são indiferentes a Sua lei.... Ele foi um poder curador. “Misericórdia quero, e não sacrifício, ” disse Ele. Este foi o teste que o grande autor da verdade usou para distinguir entre a verdadeira religião e a falsa”. (Beneficência Social, p. 36).

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Adoração, Oração e Aprendizado

O ambiente da igreja cristã deveria ser suficiente para produzir e aumentar o contingente de pessoas com excelência no conjunto da sociedade. Em geral, as comunidades cristãs usam o modelo congregacional sem ter preocupação com o conceito de igreja conforme compreendido no hebraico, ou seja, o conceito de templo, significando o local para estudos de teologia, moral, comportamento.

Êxodo 25:8 “E me farão um santuário, e habitarei no meio deles”, define o caráter do templo: a casa ou o espaço feito pelo homem para Deus. O objetivo era que do templo irradiasse a moral celeste que nortearia o relacionamento entre homem e Deus e entre o homem e outro homem. E de fato assim foi. Nos primeiros momentos depois da inauguração do tabernáculo realizado por Moisés, a presença física de Deus era vista através do shekinah. A Torah foi escrita a partir das instruções dadas diretamente a Moisés, e este instruiu ao povo. O templo era, na verdade, um centro de ensino e aperfeiçoamento cognitivo que permaneceu ativo até o cativeiro babilônico, período em que surgiu o modelo da sinagoga. Esta tinha como objetivo manter a identidade nacional, sendo local de adoração, oração e aprendizado da palavra de Deus.

A igreja cristã surgiu como desdobramento do plano da redenção, uma evolução ou transição do próprio judaísmo para a nova fase pós sacrifício vicário do cordeiro de Deus, um período superior em elementos e conhecimentos, considerando que o próprio Deus, na pessoa do Filho, desceu para ensinar e demonstrar as altas exigências celestes relativas ao relacionamento Deus/homem e homem/homem, dando à igreja cristã novas interfaces e ritos consentâneos com a nova realidade ou fase do plano divino para a salvação, mas a mesma prerrogativa de disseminadora do conhecimento, tal qual o templo e a sinagoga.

A reforma protestante do século XVI foi um evento de singular significação. Reativou verdades bíblicas que estavam enterradas pelas tradições humanas oriundas do romanismo. Tais tradições, embora rechaçadas pelos protestantes de então, persistiram na memória, especialmente dos novos conversos, e chegaram até os nossos dias. A igreja protestante atual é tão romana que aceita mais enfaticamente as tradições humanas que as verdades bíblicas. Nos vários ramos do protestantismo veem-se preteridas, por exemplo, exigências do Antigo Testamento, sob o pretexto de uma nova dispensação, negando que o Novo Testamento seja uma explicação ou cumprimento de promessas do Velho Testamento, evidenciando incontestemente as tradições que buscam adequar verdades bíblicas a épocas e costumes que, na maioria dos casos, nada têm a ver com assertivas bíblicas. Tal situação sempre leva a uma deriva das verdades e, inevitavelmente, a uma decadência moral, porque sem profecia o povo se corrompe (Provérbios 29:18).

O que se verifica hoje na realidade das igrejas protestantes é que os membros usam o ambiente religioso para diversão. Buscam um bom palestrante, uma boa música, um bom ambiente social, transformando as igrejas em clubes. Mas, a principal função das igrejas é ser um polo de enraizamento nos conhecimentos cristãos, um difusor de cultura teológica, um local de adoração e oração. Todavia, as igrejas formam concentrações sociais para o exercício do poder temporal em todas as esferas de comandos que fazem parte do ambiente eclesial. São centros de concentração de poder e divertimento, uma decadência insuportável que alimenta as tradições humanas e torna a luta entre o bem e o mal vencível pelo inimigo.

Ainda que pretendam ser centros de difusão de conhecimento teológico, deixam muito a desejar, uma vez que não são ambientes de alta cognição. Há muita assimetria no nivelamento do conhecimento bíblico por parte dos líderes e membros, o que torna o ambiente eclesial um meio de cultura para o crescimento do raciocínio humano, quase sempre contrário às leis do Reino de Deus, ou seja, a ausência de simetria  no conhecimento das verdades bíblicas, leva ao surgimento de conflitos de ideias e de comportamentos, tornando o ambiente cristão instável e propício às dissensões e embates, justamente o que a lei de Deus proíbe. Por essa razão, numa mesma denominação, congregações irmãs produzem adoração e efeitos cultuais diferentes, levando a sérias crises existenciais e de identidade, o que a Bíblia denomina Babilônia, tornando impossível a homeostase necessária para quem pretende estar no contexto de Jerusalém, o sistema divino onde reina a paz. Em Apocalipse 18:4 há uma advertência: “...sai dela, povo meu...”.

O aprofundamento nas verdades celestes tão necessário à igreja cristã passa pela compreensão do papel da igreja, um sistema criado por Deus para enobrecimento dos homens e para seu crescimento até alcançar a estatura segundo a expectativa divina. A palavra de Deus estudada em profundidade torna o ambiente eclesial o caminho para o homem retornar ao estado original obtendo a imagem do criador.

Como corolário, vejamos o que ensina o livro Profetas e Reis (página 246) de Ellen White sobre o comportamento de Daniel no cativeiro babilônico: “Na aquisição da sabedoria dos babilônios, Daniel e seus companheiros foram muito melhor sucedidos que seus colegas; mas sua cultura não veio por acaso. Eles obtiveram o conhecimento mediante o fiel uso de suas faculdades, sob a guia do Espírito Santo. Colocaram-se em conexão com a Fonte de toda sabedoria, tornando o conhecimento de Deus o fundamento de sua educação. Oraram com fé por sabedoria, e viveram as suas orações. Puseram-se onde Deus poderia abençoá-los. Evitaram o que lhes poderia enfraquecer as faculdades, e aproveitaram toda oportunidade de se tornarem versados em todo ramo do saber. Seguiram as regras da vida que não poderiam falhar em dar-lhes força de intelecto. Procuraram adquirir conhecimento para um determinado propósito — para que pudessem honrar a Deus. Compreenderam que para poderem permanecer como representantes da verdadeira religião em meio das religiões falsas do paganismo, deviam possuir clareza de intelecto e aperfeiçoar o caráter cristão. E o próprio Deus era o seu professor. Orando constantemente, estudando conscienciosamente e mantendo-se em contato com o Invisível, andavam com Deus como andou Enoque”.